segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

RESENHA CRÍTICA: O Corvo e a Filosofia da Composição de Edgar Alan Poe

RESENHA CRÍTICA: O Corvo e a Filosofia da Composição
César Eduardo da Silva Pereira*

           
Edgar Alan Poe
O Poema o Corvo, de Edgar Alan Poe, contém 108 versos que retratam um dos temas preferidos do autor, a morte. A morte segundo o próprio autor é um tema instigante, provocativo que prende atenção do leitor. E para instigar ainda mais a mente de seus leitores, ele procura enredar em sua história a morte da pessoa amada.
Então a história se passa em um quarto, que provavelmente era o quarto onde os amantes viviam, ou pelo menos se encontravam (isso fica subtendido). A perda da mulher amada (Lenora ou Leonora) faz com que a personagem principal da história, um homem, sem nome, sem rosto, sem idade definida, que pode ser identificado como um homem culto pelo hábito da leitura, exausto e quase adormecido, à meia noite comece a ouvir ruídos em sua porta, e depois em sua janela.

Quando se dá conta que é um simples pássaro, um corvo, diga-se de passagem, uma ave que traz consigo uma representação de mau agouro, o homem abre a janela e o corvo adentra pelo quarto e se repousa sobre um busto de minerva (Deusa da sabedoria, das artes e da estratégia de guerra em Roma), outro indício da erudição da personagem central. Logo em seguida, o homem inicia um diálogo com o pássaro. Aqui se percebe uma característica das estórias de Edgar Alan Poe, a presença do fantástico.

Todas as questões elaboradas pelo homem recebem a mesma resposta “nevermore” “nunca mais”. Algo que pode ser explicado racionalmente pelo fato de o corvo poder ter sido adestrado a repetir tal palavra, como um papagaio. Já no que se refere às questões, a cada estrofe o homem as elabora com o propósito de que a própria resposta já esperada do corvo, “nevermore” “nunca mais”, o aproxime de sua amada tão distante. Sendo que as perguntas se referem à possibilidade de ambos estarem juntos novamente. Poe sempre busca em suas estórias retratar as mazelas humanas, e no poema “O Corvo”, isso não é diferente. As perguntas que a personagem principal faz ao corvo o enchem de melancolia, e a cada nova pergunta era como se o homem se autotorturasse pela perda da mulher amada.
Quanto ao texto filosofia da composição, o autor demonstra uma preocupação com a própria composição, elaboração, sintetização, esquematização do texto. Primeiramente, ele ressalta que existem três classes de autores: A primeira, não revela os seus segredos literários de forma alguma; A segunda, não se preocupa com esse revelar ou não se lembram de como se dá o processo de composição de um texto; Já a terceira, na qual Edgar Alan Poe se inclui, não vê problema algum em revelar seus segredos de composição. Sendo assim, nesse texto, o autor revela os segredos de composição de seu poema mais famoso: O Corvo.
O autor segue seu texto destrinchando os passos da composição. Neste trabalho pode-se perceber a presença de onze passos descritos pelo autor no processo de composição da obra supracitada. A saber:
1º passo: Extensão: a primeira preocupação que o autor demonstra com sua obra é a extensão da mesma, ou seja, o tamanho de sua obra. Segundo o próprio autor, quando o teto é muito grande o poema perde seu encanto, a sua paixão, a sua emoção, a sua aura, o seu “hic et nunc” como diria Walter Benjamim. Por isso, Poe escolhe o número de 108 versos para sua obra, tamanho em que o leitor pode em uma assentada degustar das palavras e dos sentimentos imbuídos no cerne do texto.
2º passo: Província: Este passo se refere a escolha do efeito a ser obtido pelo poema, que neste caso o escolhido foi o efeito da Beleza. O autor considera que este é o melhor efeito para um poema, e que caso fosse escrever em prosa os melhores efeitos são a Verdade e a Paixão.
3º passo: Tom: A escolha do tom, também é de suma importância, e evidencia uma característica do autor que sempre prefere lidar com os sentimentos humanos principalmente os que causam, geram e evidenciam a Tristeza.
4º passo: Efeito Artístico: Ao se debruçar nos estudos de efeitos artísticos, Edgar Alan Poe chega a conclusão de que o melhor para a sua obra é o refrão, o estribilho.
5º passo: Natureza do Refrão: Ao se deparar com a escolha do refrão, que é o efeito mais unânime entre os autores, Poe precisa escolher a natureza desse refrão, e a opção que ele faz é a repetição de uma só palavra no final de cada estrofe. A palavra escolhida foi “nevermore” “nunca mais”, por causa da sonoridade que ela produzia em cada refrão.
6º passo: Pretexto para o uso do Refrão: Não bastaria apenas escolher o refrão e a sua natureza. Era preciso que o autor dentro do enredo da história encontrasse um pretexto para o uso da palavra “nevermore” “nunca mais”. Ele o encontra na figura de um ser impregnado de uma representação maléfica. O pássaro, Corvo, contém essa representação, e, além disso, se o pássaro fosse ensinado, adestrado, ele poderia repetir palavras como o refrão escolhido “nevermore’.
7º passo: Tema: A morte, tema escolhido pelo autor está presente em diversas de suas obras. E como o próprio autor afirma: nada é mais atraente para a curiosidade humana em um texto do que ler sobre a morte da amada, retratada pelo próprio amante, que agoniza melancolicamente um possível reencontro entre os dois.
8º passo: O ponto de partida: Poe escolhe escrever e compor o enredo de sua estória a partir de uma estrofe que seria o seu clímax. Sendo assim, ele compõe primeiro tal estrofe que geraria esse efeito no leitor, e a partir dela comporia todas as outras estrofes que antecedem e que sucedem o clímax.
9º passo: Versificação, métrica e ritmo.  Neste passo, o autor demonstra uma preocupação com a originalidade do conjunto de sua obra ao se preocupar com os recursos estilísticos a serem usados em seu poema. O autor afirma no texto, que todos os tipos de versos escolhidos por ele já foram usados separadamente em outras obras, mas que em uma única obra, é a primeira vez que são usados juntos. Isto quer dizer que a originalidade da obra O corvo, está na combinação na estância dos versos.
10º passo: Local: Essa é uma escolha central para o poeta já que o mesmo deveria ser um local onde os amantes se encontravam, e nada melhor que um quarto, onde possivelmente eles se deleitavam.
11º passo: Enredo: O último passo da composição de Edgar Alan Poe descrito por ele mesmo é a elaboração de um enredo fantástico que já foi descrito na análise de o corvo feita nos quatro primeiros parágrafos desta resenha.
Ao analisar o texto Filosofia da Composição, percebe claramente que o trabalho de um escritor literário é muito parecido com o trabalho de um historiador. A composição de um texto histórico também depende de uma série de escolhas feitas pelo próprio historiador. Escolhas estas que vão desde a escolha: de um tema e da formulação de uma ou mais hipóteses; do ponto de partida para sua pesquisa; de um recorte espaço temporal, já que é preciso delimitar sua pesquisa a um tempo e a um local específico; das fontes de pesquisa, sejam elas bibliográficas, documentais, orais, vestígios arqueológicos, entre outros; das personagens, atores sociais envolvidos na trama da história a ser construída; das representações a serem retratadas; do próprio tratamento que o historiador vai dar a sua obra; entre outros. Sendo assim, o trabalho árduo de um escritor literário pode ser comparado também ao ofício do historiador.


* Aluno do Programa de Mestrado em História Cultural pela PUC-Goiás.


PEREIRA, César E. S.: POE, Edgar Alan. O Corvo e a Filosofia da Composição. In: Edgar Alan Poe: Ficção completa, poesia & ensaios.

Informações sobre o autor:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Edgar_Allan_Poe

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